“Percalços de uma velha cidade”, por Luís Estevam

Texto do escritor Luís Estevam

(Foto: Em Catalão, Praça Getúlio Vargas – Reprodução)

Quem nasceu em Catalão, ou escolheu Catalão para morar, é um privilegiado. Ainda mais agora, em 2024, quando o lugar completa 165 anos de cidade e 302 anos de existência. Motivos para se orgulhar não faltam. Principalmente ao constatar que, ousadia, coragem e independência fazem parte da formação do nosso povo.
Catalão, desde o início, esteve à sombra da história oficial. Temos poucas referências de nossa origem e dos primeiros tempos. Nem mesmo o pavoroso massacre de indígenas em nossa região foi devidamente registrado. O lugarejo esteve praticamente fora dos acontecimentos de destaque no contexto do estado de Goiás.

No começo, enquanto todos procuravam ouro, Catalão se voltou para o trabalho cotidiano na agropecuária. Aqui não se descobriu ouro, embora todo o ouro extraído em Goiás, certamente tenha cruzado pelo nosso ponto de pouso. E, ao contrário das cidades mais velhas de Goiás, Catalão nunca trocou de nome. De Sítio do Catalão virou Arraial do Catalão, Vila do Catalão e, por fim, Cidade de Catalão.

Enquanto todos endeusavam as famílias tradicionais de Goiás em busca de cargos públicos, Catalão acolhia inúmeras famílias de imigrantes estrangeiros voltados para o trabalho na indústria e no comércio. Assim, enquanto disputavam maior proximidade com o poder estadual, Catalão, no seu isolamento, formava uma comunidade orgulhosa, ousada e independente.

Como cidade de fronteira forjou a sua própria identidade. Não copiou nada de ninguém, muito menos se sujeitou a ordens ou determinações de fora. Esteve à margem da historiografia oficial, tecendo a sua própria história.

Nunca aceitaram que Catalão fosse o lugar mais antigo de Goiás. Mas, arrancaram a cruz dos bandeirantes do nosso município, levando-a para se tornar o marco de criação do estado. Por ironia, a prova simbólica do início de Goiás é a chamada Cruz do Anhanguera… retirada de Catalão e levada para outro município.
O título de “Atenas de Goiás” não fomos nós que criamos ou inventamos. Resultou de uma ampla pesquisa, coordenada pelo vilaboense Francisco Ferreira dos Santos Azevedo, reconhecendo que Catalão, em 1910, abrigava os maiores intelectuais do estado.

Todavia, não reconheceram que Catalão era a capital econômica de Goiás, na primeira metade do século passado, sediando a indústria, agropecuária e comércio mais evoluídos. Por cima, levaram daqui centenas de imigrantes estrangeiros para erguer o eixo econômico de Goiânia e Anápolis.

Quando veio a II Guerra Mundial, apenas um soldado do estado de Goiás morreu em combate. Foi o catalano Aldemar Fernandes Ferrugem que levou um tiro de fuzil alemão na gelada trincheira italiana. Até hoje não se fez reconhecimento justo ou homenagem estadual ao herói catalano.

Quando Catalão ganhou as eleições para governador, em 1954, forjaram outro resultado nas urnas, não permitindo o ingresso de um catalano na cúpula do poder estadual. Até o Supremo Tribunal Eleitoral reconheceu a grande fraude… muito posteriormente.

Desse modo, cada morador de Catalão carrega uma história muito bonita, repleta de obstáculos e que fomentam o orgulho e a grandiosidade da terra em que vivemos.

Hoje temos uma nova cidade, que oferece alta qualidade de vida, temos administradores que cuidam bem do município e temos um povo independente, ousado e corajoso que sabe o que quer.

Comentários