MPGO garante recuperação ambiental recorde de quase R$ 20 milhões por incêndio ao longo da linha férrea, entre Urutaí e Ipameri

Atuação extrajudicial compositiva do MPGO garante recuperação ambiental recorde por incêndio causado através retroescavadeira em chamas que estava sendo transportada na linha férrea da Ferrovia Centro Atlântica. o fogo propagou para várias propriedades da região localizadas nos municípios de Ipameri e Urutaí

(Foto: Reprodução)

Uma indenização de quase R$ 20 milhões para reparação ambiental pelos danos causados por um incêndio foi garantida pelo Ministério Público de Goiás (MPGO) por meio de atuação extrajudicial autocompositiva. O valor total, de R$ 19.821.939,48, é considerado recorde no âmbito da atuação do MPGO, seja judicial ou extrajudicial.

Essa solução consensual de um litígio de alta complexidade foi obtida após um ano e sete meses de intensos diálogos e negociações. O caso que demandou a atuação autocompositiva foi o incêndio ocorrido entre 15 e 18 de setembro de 2020 ao longo da linha férrea da Ferrovia Centro Atlântica (FCA) entre os municípios de Ipameri e Urutaí. O incidente resultou em 3.737,71 hectares de terra e vegetação queimados e 34 propriedades rurais afetadas, além de diversos outros danos ambientais. A título de comparação, um campo de futebol tem aproximadamente 1 hectare.

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“A autocomposição é o futuro da atuação do Ministério Público. É a forma mais eficiente de trazer resultados à sociedade. O diálogo é o caminho a ser percorrido, sempre”, afirma o procurador-geral de Justiça Aylton Flávio Vechi, ao avaliar a solução consensual do litígio.

Após as investigações iniciais criminais inconclusivas, o caso foi levado, em maio de 2021, para a mediação do MPGO, por meio do Núcleo Permanente de Incentivo à Autocomposição (Nupia), que tem a atuação voltada à busca de soluções consensuais. A própria empresa ferroviária buscou a negociação, manifestando disposição de reparar os danos.

Foi, então, criado o Grupo de Trabalho (GT) Incêndio na Linha Férrea, composto pelas promotoras de Justiça integrantes do Nupia Marta Moriya Loyola, Melissa Sanchez Ita e Mônica Fachinelli Silva; pela promotora Márcia Ferreira Gomes, da 3ª Promotoria de Justiça de Ipameri, e pelo promotor Bruno Barra Gomes, que respondia à época pela Promotoria de Urutaí. Também atuaram os promotores Leandro Franck de Oliveira Ávila, da 1ª PJ de Ipameri, e Marcelo Borges Amaral, da 1ª PJ de Pires do Rio. O subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Jurídicos, Marcelo André de Azevedo, e o promotor de Justiça Juan Borges atuaram na investigação criminal.

“Não teria sido possível obter esse resultado pela via judicial por duas razões principais: a empresa – que é quem vai cumprir as obrigações – participou da construção da solução do caso e também porque processos judiciais com essa complexidade costumam durar décadas até uma decisão final”, pondera Melissa Ita, coordenadora do GT.

Marta Moriya Loyola destaca a importância da solução autocompositiva para a obtenção de resultados socialmente relevantes, que não seriam obtidos pela via judicial. “O processo de negociação envolveu a escuta da comunidade impactada e o conhecimento das dificuldades enfrentadas pelos órgãos de fiscalização na execução de seu trabalho. O trabalho dos integrantes permitiu aprofundar a análise do problema e o retorno de benefícios à comunidade impactada e à sociedade em geral, além de medidas preventivas para que eventos como esses não se repitam”, reforça.

Intercâmbio com especialistas trouxe subsídios para a mediação

Ao longo desses 17 meses de negociação, o GT realizou 46 reuniões, 6 delas com a FCA e outras com os órgãos beneficiários da destinação dos valores. Boa parte dos proprietários rurais afetados foi ouvida pelo grupo, podendo expor as consequências que sofreram com o incêndio. O GT também demandou e obteve a realização de mais duas perícias, além das que já haviam sido feitas à época.

As integrantes do Nupia destacam ainda a importância do intercâmbio com especialistas de outros Estados, para obter os subsídios que orientaram a atuação. Além do diálogo com técnicos da área, a promotora Melissa Ita enfatiza o intercâmbio ocorrido com a coordenadora da força-tarefa do MP de Minas Gerais que atuou no caso de Brumadinho, Andressa de Oliveira Lanchotti.

Com a conclusão da autocomposição, foi assinado um termo de ajustamento de conduta (TAC) prevendo o pagamento dos quase R$ 20 milhões a título de reparação pelos danos ocorridos. No cálculo, foram avaliados, além dos danos materiais, o dano moral, dano social, o dano intercorrente e o dano intergeracional (que se estende por gerações).

O valor será pago em até 30 dias úteis após a assinatura do TAC, ocorrida na terça-feira (8/11). A maior parte da indenização – pouco mais de R$ 14 milhões – será destinada a apoiar e equipar órgãos do Estado que atuam na investigação de crimes ambientais e na fiscalização ambiental. Cerca de R$ 4,4 milhões vão para a execução do plano de medidas preventivas, visando a evitar novos acidentes. E R$ 102 mil serão empregados na capacitação da sociedade local em atividades de defesa civil.

Melissa Ita pontua que uma das preocupações que nortearam as negociações foi a de definir um acordo que pudesse representar um resultado efetivo para a sociedade, com o retorno em ações de preservação ambiental e proteção do bioma Cerrado.

A promotora ressalta a importância da participação de técnicos no grupo de trabalho. Integraram o GT as servidoras e servidores do MPGO Tiago Brito (perito ambiental), Rogério César (chefe da Coordenação de Apoio Técnico-Pericial), Adriane Chagas Oliveira e Maria José Ferreira Soares, servidoras da Coordenadoria de Assessoramento à Autocomposição Extrajudicial (Caej) e do Nupia.

Valores vão ajudar a equipar órgãos de fiscalização ambiental

Entre os órgãos e entidades que serão beneficiadas com os recursos da reparação ambiental estão o Comando de Operações do Cerrado da Polícia Militar de Goiás, o Comando do Corpo de Bombeiros do Estado, o Instituto de Criminalística e a 23ª Companhia Independente dos Bombeiros de Ipameri. Projetos nos municípios afetados também serão contemplados, como o Espaço Cerrado Vivo, do IF Goiano, e de construção de um galpão de reciclagem, em Urutaí, além de iniciativas de recuperação de nascentes e áreas de preservação permanente na região, com repasses aos Fundos Municipais de Ipameri, Urutaí e Pires do Rio.

Entre as iniciativas a serem financiadas, está a estruturação do departamento de perícias ambientais do Instituto de Criminalística e a aquisição aparelhos e serviços que viabilizarão a comunicação via satélite para o Comando de Operações do Cerrado da PM.

Um outro projeto que será beneficiado é o Tempo É Vida, da Associação de Combate ao Câncer de Goiás, que tem como objetivo aumentar o número de leitos e a estrutura do Setor de Transplante de Medula Óssea do Hospital de Câncer Araújo Jorge. Confira abaixo o quadro com os valores a serem repassados a cada beneficiário.

Texto: Ana Cristina Arruda – MPGO

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