Audiência pública debate prejuízos causados pela Enel em Goiás

Encontro realizado neste sábado, 15, rendeu reclamações de diversos segmentos sociais que sofrem com as quedas de energia e falta de investimentos na rede elétrica do Estado

 

“A Enel está dando prejuízo não só para Goiás, mas para o Brasil e para o mundo”, afirmou Eurípedes Naves Borges, que trabalha com compra e venda de transformadores em leilões, durante audiência pública realizada neste sábado (15/02), na Fundação Tiradentes, em Goiânia. Segundo ele, os empresários do Estado de Goiás estão ‘indo a falência’ e levando ele junto. Eurípedes, que já trabalhou na Celg Distribuição, também foi proprietário de uma empresa de engenharia elétrica e, agora, está há 30 anos trabalhando com leilões.

“Eles dizem que estão aplicando dinheiro, mas estão destruindo os laboratórios de reforma dos transformadores”. Atualmente, os equipamentos que necessitam de reparos devem ser enviados para São Paulo, o que demora 30 dias. “Até chegar, a lavoura irrigada já morreu, o frango já morreu”, concluiu Eurípedes.

Nara Coutrim, representante da Feira Hippie de Goiânia e dos moradores da cidade de Sanclerlândia, reivindicou respeito por parte da empresa à população e testemunhou sobre as constantes quedas de energia em toda a cidade que ela representa. “É muito fácil para os engravatados, que lucram com esse contrato, defender a empresa, o contrato. Quero pedir para vocês o respeito com a sociedade, não só com empresários, porque não é só de empresários que é formada a população. É a mãe de família que precisa de energia e que, muitas vezes, é pega desprevenida, àquelas pessoas que estão em hospitais, porque é muito fácil, colocar palavras bonitas, bem colocadas, que às vezes muitos entendem, mas a grande maioria não”, pontuou.

O proprietário de um loteamento, Sinomar Ribeiro, veio de Aurilândia para participar da audiência pública. Ele teve um prejuízo de R$ 300 mil na compra de materiais de construção e, mesmo após vistoria realizada pela Enel, teve que paralisar as obras. “Comprei e paguei o material em 2019, como exigido. A Enel fez a vistoria em 2019, como combinado. Só que entrou 2020, eles falaram que o material não serve mais”, contou. Entre as perguntas realizadas pelos participantes do encontro aos diretores da Enel, o empresário ainda, em voz alta do meio da sala, disse que não confia na empresa. “A Enel quer segurança jurídica do investimento dela, mas não dá segurança jurídica do meu investimento. Só quero que a Enel me dê o suporte, que é obrigação dela”, desabafou Sinomar.

O médico Diogo Jacó, que tem duas clínicas radiológicas, uma localizada em Goiânia e outra no interior de Goiás, declarou que utiliza energia solar para garantir o funcionamento das máquinas, mas que por diversas vezes já ficou sem energia elétrica nas unidades de saúde, o que o fez recorrer a um gerador. “Ter um gerador para manter uma ressonância magnética é uma sala de gerador. A rede fica ruim e começa a queimar meu equipamento. Deixo três dias sem ligar, deixo meu gerador rodando e vai consumindo diesel. Isso é caro. É esse tipo de coisa que revolta o goiano”, disse.

Debate

O propositor da audiência pública, o deputado federal Vitor Hugo, que é líder do governo federal na Câmara dos Deputados, relatou números expressivos relacionados a insatisfação da população goiana. Só em 2019 foram mais de 133 mil reclamações contra a Enel. “Muitas chegaram direto na Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica], porque existe um sentimento de que, e falo isso abertamente, há uma falha de comunicação dentro da empresa”, disse o deputado. No site Reclame Aqui, o quantitativo de queixas chegou a 1.944, com 493 reclamações a mais que 2018.

Para o governador Ronaldo Caiado, o fato de a empresa ter ganho o leilão de privatização da Celg D não dá direito que a população sofra com a falta de investimentos. “Não podemos admitir que, só porque ganharam uma licitação, se achem imune em poder fazer todas as arbitrariedades com o povo goiano”, disse citando as frequentes quedas de energia e períodos longos em que a população fica desabastecida, principalmente no interior de Goiás. Após ver a exposição dos dados feitas pelos representantes da Enel, o governador ainda reiterou que “os prejuízos que isso acarreta na vida do cidadão não podem ser contemporizados com alguns dados”.

Exposição da Enel

Durante a audiência pública, os representantes da Enel tiveram 30 minutos para expor tudo que foi feito desde a compra da Celg D e principalmente desde fevereiro de 2019 para solucionar a crise energética em Goiás. De acordo com o presidente da empresa no Estado, José Luiz Salas, já foram investidos cerca de R$ 2 bilhões e a expectativa é de que sejam aplicados ainda mais R$ 3,2 bilhões. “É um investimento que está sendo feito, e que será feito, no Estado como um todo. Na Região Norte, por exemplo, temos várias obras para entregar como em Luziânia, Uruaçu, Formosa, Anápolis e na Região Sul, em Morrinhos, Iporá, Rio Verde”, anunciou.

Na tentativa de justificar a queda da qualidade do serviço prestado, o diretor de Infraestrutura e Redes da Enel, Guilherme Lencastre, retomou o discurso de que assumiram a companhia com muitos problemas. “O que posso dizer hoje é que os problemas são menores”, disse. Em seguida, o diretor reforçou que a meta é dialogar mais com a população e demonstrar na prática como está o andamento dos investimentos realizados. “Estamos construindo esse caminho, com muito empenho, vontade, motivação. Queremos trabalhar juntos com o Estado e com a sociedade”, e completou: “Nosso compromisso é com o consumidor de energia de Goiás”.

Indicadores de qualidade

Os principais indicadores de qualidade na prestação de energia elétrica são o FEC e o DEC. O primeiro trata da frequência de vezes que algum lugar ficou sem energia. O segundo, o tempo total que o local ficou sem energia. Conforme o secretário estadual de Desenvolvimento e Inovação, Adriano da Rocha Lima, o acompanhamento desses indicadores é feito por um número único, o que não é uma vantagem, uma vez que a prestação de serviço pode melhorar em uma região densa, como Goiânia, e piorar no interior de Goiás, e ainda assim estar dentro da média aceitável. Além disso, ainda segundo o secretário, quando a Enel assinou o contrato de concessão, a Aneel ofertou limites de FEC e DEC maiores.

Adriano da Rocha Lima ainda informou que, das 156 regiões chamadas de conjuntos elétricos do Estado de Goiás, 66 tiveram queda no índice de DEC. Desse quantitativo, 15 pioraram 500% a prestação de serviço. Os conjuntos que tiveram melhorias somam 90 conjuntos elétricos, mas esse avanço chegou apenas a 55%.

O Plano Emergencial estabelecido em fevereiro de 2019 previa uma série de investimentos para a ampliação das redes elétricas e solução da crise energética em Goiás. A Enel tem até agosto de 2020 para cumprir o acordo. Caso contrário, o não cumprimento do compromisso com o Governo de Goiás implicará em um relatório de falhas e transgressões, que é emitido pela Aneel, seguido da possibilidade de um processo de caducidade de licença. “De fevereiro de 2019 até hoje, apesar de reconhecer que a Enel tem investido, ampliado subestações, a qualidade do serviço está muito aquém do que a gente necessita no Estado”, afirmou o secretário.

Presente na audiência pública, o diretor da Aneel, Rodrigo Limp, endossou as palavras de Adriano e defendeu que a qualidade do serviço prestado pela Enel está abaixo das médias. “Os indicadores de qualidade estão muito aquém do que a Aneel entende como adequado. Temos feito um trabalho mais próximo, que é o que nós chamamos de Plano Emergencial, para recuperar a qualidade do serviço em um curto prazo. Mas ainda entendemos que temos um longo caminho a percorrer”, destacou.

Os deputados federais Flávia Morais, líder da bancada goiana na Câmara; Glaustin da Fokus; e o deputado estadual Paulo Trabalho manifestaram suas demandas, em vista de que também são representantes da população e estão em constante contato com as bases no interior do Estado. “Somos os para-choques das reclamações. Sempre chegam até nós os problemas sobre energia. Ninguém aqui é contra a iniciativa privada, mas toda empresa tem que ter responsabilidade social”, afirmou.

Representando o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, o secretário-adjunto de Energia Elétrica, Domingos Romeu Andreatta, reafirmou o compromisso em auxiliar o Estado de Goiás na solução da crise energética. “Cobro novamente publicamente da Enel que faça e tenha todo o empenho para resolver essa situação da maneira mais rápida possível, para que a gente possa esquecer da Enel em um futuro próximo”, disse. Segundo o secretário-adjunto, o ideal é que os goianos saibam quem é a empresa que presta o serviço de distribuição de energia elétrica, mas não tenham que se preocupar com isso. “Devemos exigir da Enel ao ponto de esquecermos dela em algum momento. Quando não lembrarmos da Enel é porque tudo estará muito bem”. Além disso, Domingos Romeu salientou que energia elétrica é fundamental para o desenvolvimento das cidades e que este não pode ser um fator de impedimento econômico: “Goiás tem que ter a energia elétrica com a qualidade que merece. Energia elétrica não pode ser uma coisa que limita a entrada de novos empreendedores”, finalizou.

Também participaram da audiência pública o presidente da OAB-GO, Lúcio Flávio de Siqueira Paiva; o deputado federal Francisco Júnior; o secretário de Estado Marcos Silva (Comunicação); o senador Vanderlan Cardoso; o gerente de energia da AGR, Jorge Pereira; o presidente da Comissão Especial de Direito de Energia, Moacir Ribeiro da Silva Neto; o tenente-coronel Cleber Aparecido Santos, presidente da Fundação Tiradentes; os gerentes da Enel José Januário e Renata Keli; o chefe de gabinete de representação de Goiás no Distrito Federal, Breno Vieira; representante da AGM, Eri Ristov; além de prefeitos, vereadores, presidentes de Associações e Sindicatos, e membros do Fórum Empresarial.

Com informações da Secretaria de Comunicação – Governo de Goiás| Fotos: Júnior Guimarães

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