A Capela Sistina do sudeste goiano

Igreja São João Batista, em Cumari, na época de sua construção (Foto: Reprodução)

Igreja São João Batista, em Cumari, na época de sua construção (Foto: Reprodução)Algumas capelas e templos católicos estão sendo reformados e reconstruídos na região de Catalão, tanto na cidade como nos povoados e municípios vizinhos. Em Olhos D’água e na Pedra Branca os trabalhos de restauração terminaram recentemente e na área urbana de Catalão o destaque fica por conta da imponente torre da Igreja São Francisco e da reestruturação em andamento na Nova Matriz.

Interessante que, as obras obedecem a um estilo e a uma temática religiosa própria, sem a preocupação de conservar a feição arquitetônica original dos prédios. O novo vai se sobrepondo ao velho nessa busca de imponência que os templos merecem ter. Catalão irá ganhar, sem dúvida, com o embelezamento de suas igrejas e com maior comodidade oferecida aos fiéis.

Fachada da Matriz de São João Batista após sua reforma (Foto: Reprodução)

Mas, em se tratando de reformas e restauração, a obra na Matriz de Cumari foi emblemática. Além de conservar grande parte da fachada arquitetônica do prédio, aquela cidade ganhou uma verdadeira obra de arte. A Igreja São João Batista recebeu novos altares e diversos painéis, alusivos ao velho e novo testamentos, inspirados no estilo da pintura medieval, lembrando os afrescos da majestosa Capela Sistina em Roma. Tanto que, a Matriz de Cumari vem se tornando local de curiosidade artística e visitação.

Não é para menos. A Capela Sistina é um tesouro da humanidade e um dos locais mais visitados do mundo. Fica quase escondida no meio do museu do Vaticano e abriga uma das maiores e mais valiosas coleções de pintura medieval do planeta. A Capela Sistina recebeu o seu nome em homenagem ao Papa Sisto IV, que começou a restauração da antiga igrejinha por volta de 1478, sem imaginar que o local se tornaria, ao longo dos séculos, visitado por milhares de turistas a cada ano. Os painéis da Capela abordam temas religiosos e grande parte deles teve a participação de Michelangelo que dedicou anos a fio na pintura dos murais e teto da construção.

No caso de Cumari, as reformas da igreja São João Batista conservaram parte da fachada original e trouxeram interessantes modificações. Capelas anexas e altares temáticos, bem como os painéis distribuídos pelo recinto, vivenciam o estilo medieval e lembram os afrescos preservados na Capela Sistina.

A obra de restauração da igreja em Cumari, dirigida pelo padre Murah Rannier Peixoto Vaz, combinou com o perfil da cidade. Cumari conserva alguns prédios imponentes que remontam à época do seu apogeu e a restauração da igreja, em estilo tradicional, fortalece a nostalgia religiosa e cultural do município.

A Capela Sistina do sudeste goiano (Foto: Reprodução)

Atualmente Cumari possui cerca de três mil habitantes, menos da metade dos moradores que tinha na década de 1950. Em um curto período, o município conheceu o auge e o declínio econômico. Mas, continuou sendo uma cidade bonita, conservando alguns prédios que lembram o brilhante passado que vivenciou.

O surgimento do aglomerado urbano de Cumari começou por volta de 1908 com a instalação de um barracão comercial para atender viajantes e operários da estrada de ferro. A intenção do comerciante pioneiro era aproveitar o movimento que surgia com as picadas abertas para implantação da ferrovia. A partir da inauguração ferroviária, em 1913, nasceram construções em torno da estação dando origem ao arraial.

Em 1927, depois de reivindicações feitas por moradores, Cumari foi elevado à categoria de distrito. Sua emancipação veio em 1947, desmembrando-se do município de Goiandira, e o seu apogeu econômico ocorreu por volta de 1950, época em que alcançou quase sete mil habitantes.

Com o tempo, Cumari veio perdendo fôlego. Primeiro em função do desmembramento e emancipação de Anhanguera, posteriormente pela desativação da ferrovia que cortava o município e, por fim, em razão do atrativo econômico regional que Catalão passou a exercer sobre cidades vizinhas.

Na realidade, o incentivo econômico de Cumari esteve ligado à ferrovia, perdendo muito com a desativação da linha que cortava a cidade. Hoje somente existe o prédio da pequena estação ferroviária desativada. Mas, a arquitetura urbana de Cumari evoca fortes lembranças do tempo de seu apogeu. Grandes moradias e obras clássicas embelezam a cidade, transmitindo glórias de um passado não muito distante.

Um dos marcos históricos da cidade é a Igreja São João Batista, edificada na primeira metade do século passado, que se tornou a Matriz de Cumari. A paróquia foi instalada em 1952 e esteve sob a ordem dos padres franciscanos por mais de uma década. Posteriormente a administração paroquial ficou por conta de padres diocesanos residentes naquela cidade.

Em 2017, o jovem padre diocesano, Murah Rannier Peixoto Vaz, assumiu os destinos da paróquia e promoveu, com o auxílio dos fiéis, uma ampla reforma naquela igreja. Construiu duas capelas laterais erigindo novos altares para colocação das imagens e encomendou mais de uma dezena de painéis de azulejos artísticos, contendo imagens do antigo e novo testamentos, no estilo das pinturas medievais.

Com a aquisição de novas esculturas – São Sebastião, Senhor Morto, Jesus Ressuscitado, São Miguel Arcanjo e São José – a igreja ficou inteiramente revitalizada.

O esmero e o dinamismo do padre Murah estão presentes em cada detalhe da Matriz de Cumari que se tornou uma obra de arte. Nas suas palavras, “a arte e a beleza nos apontam para aquilo que é transcendente. E o belo, por excelência, é Deus”.
De fato, a magnificência exterior acaba repercutindo na realidade interior de cada fiel. Como acontece na Capela Sistina, há muitos séculos, com seus milhões de visitantes.

Escrito por: Luís Estevam

Luiz estevam é doutor em Economia pela Unicamp, membro titular do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG) e da Sociedade Goiana de História da Agricultura (SGHA).

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